Aos 22 anos, Bárbara Tinoco prepara-se para pisar os palcos dos coliseus, com atuações em Lisboa, no Porto e em Ponta Delgada. Os concertos servem de apresentação de “Bárbara,” o seu primeiro álbum, lançado a 22 de outubro. Em entrevista à FORUM, a artista partilha o seu processo criativo e conta como este trabalho foi também uma autodescoberta: “[Este álbum] sou eu a descobrir-me [...] enquanto pessoa, compositora, mulher, artista”.
Estudaste Ciências Musicais na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa, que saberes é que achas só encontras num curso no ensino superior?
Eu acho que a faculdade é muito importante e quando era mais nova não percebia a importância de estudar. Eu não queria ir para o ensino superior e ainda bem que os meus pais me obrigaram a ir, porque são anos mesmo importantes na nossa formação. A faculdade dá muitas ferramentas, desenvolve o trabalho de equipa, a forma de estar com os outros e contigo – são os últimos anos antes de ser adulto.
Que memórias tens dos tempos em que estudavas?
Eu sou uma pessoa muito pouco académica no espírito. Não bebo álcool, não saio à noite, não vou a discotecas. Não me identificava com a praxe, porque não sou boa em dinâmicas de grupo, mas acho que é um bom ambiente para fazer amigos. As minhas memórias são, sobretudo, dos meus amigos, de ficar à conversa no café. Lembro-me da comida do café, porque amava, e lembro-me das pessoas que trabalhavam lá, que eu adoro.
«As canções às vezes são só um desabafo [...] E depois há canções que surgem da vontade de falar sobre certas coisas, em que tens algo específico a dizer»
Que tipo de aluna eras?
Sempre fui uma aluna bastante medíocre, porque tenho uma aprendizagem muito seletiva, e só consigo concentrar-me naquilo que adoro, e não adoro estudar. Havia pessoas que diziam “quando começares a trabalhar, vais ter saudades de estudar”, e eu não tenho. Adoro trabalhar, adoro fazer coisas.
Quem escolheu “Bárbara,” para nome do álbum? Foste tu ou o teu pai, que costuma dar nome a muitos dos teus projetos?
O meu pai deu o nome à maior parte das canções do álbum, porque ele é bom a fazer isso e eu não sou, mas o título fui eu que escolhi. Apesar de muitas pessoas dizerem que escolhi mal, eu acho que este é o título certo para este álbum. Este é um álbum que é muito de mim para mim, irrepetível, inocente, genuíno. É quase o início de uma carta, de uma mensagem, “Bárbara,”, e estou eu a falar comigo. Sou eu a descobrir-me, a descobrir a minha sonoridade, sou eu enquanto pessoa, compositora, mulher, artista, sou eu enquanto menina de 16 anos no meu quarto.
O que descobriste sobre ti com o álbum?
Eu costumava pensar que para ser compositor e artista é preciso ser corajoso, ter coragem para dizer coisas e falar sobre elas. Quando tive de cantar as canções à frente da minha banda, apercebi-me de que tinha vergonha de algumas, e pensava que podia ter guardado aquela canção para mim, porque o sentimento era feio. Mas ter vergonha de cantar significa que essa canção é importante e que é preciso ser corajoso e lançar na mesma. No álbum, há duas que acho que são as mais difíceis: uma chama-se “O teu namorado” e a outra “Tragédia”.
Porque é que o álbum não tem parcerias?
Quando comecei a juntar as músicas para o álbum, apercebi-me de que tinha muitas colaborações e de que já tinha escrito aquelas canções mais crescida, com mais maturidade e com outra visão sobre o que é a minha profissão. E não quis estragar a inocência e genuinidade deste álbum com coisas que criei nessa fase. Então, decidi que as colaborações ficavam todas no EP, que vou vender juntamente com o álbum.
Como é o teu processo criativo?
É uma cena um bocado difícil. Agora, mais crescida, as canções às vezes são só um desabafo, que precisas de escrever e nem sabes se vais lançar ou não. E depois há canções que surgem da vontade de falar sobre certas coisas, em que tens algo específico a dizer.
Que mensagens queres transmitir?
Gosto de pôr a mulher fora do papel da menina inocente, gosto de dizer asneiras porque eu digo muitas, assim como toda a gente na nossa geração. Lá fora, dizem imensas e as canções passam na rádio, os rappers dizem imensas e eu também digo. É genuíno em mim e há coisas que não substituem um palavrão.
Qual é a tua banda sonora neste momento?
Eu ouço muito a música recente, mas ouço maioritariamente pop, que é o que me dá prazer. Ouço todas as músicas portuguesas que saem e todas as que saem lá fora. E depois ficam aquelas que me chamam mais a atenção na última sexta, que é o dia em que são lançados os álbuns.
«Gosto de pôr a mulher fora do papel da menina inocente, gosto de dizer asneiras porque eu digo muitas, assim como toda a gente na nossa geração […] É genuíno em mim e há coisas que não substituem um palavrão»
Se tivesses de escolher dois pais na música, quem seriam?
Escolhia o Miguel Araújo, que é a minha maior influência na música, e a Suzanne Vega. São dois compositores que contam histórias nas canções e que marcaram muito o meu estilo de composição. Eu acho que sou filha do folk americano e do folk português.
Ganhaste, recentemente, o Globo de Ouro de Melhor Intérprete, que achavas que não merecias...
É verdade, fizeram-me essa maldade. Eu estava nomeada para três categorias e achava que aquela era a que eu não merecia, em que estavam nomeados a Carolina Deslandes, que fez um projeto incrível no ano passado, o Camané e o Dino d’Santiago. Nos primeiros três segundos, pensei “não acredito que me fizeram isto, eu nem sei como agradecer este prémio”, porque é difícil agradecer um prémio que sentes que não mereces. Mas foi importante para mim, para eu perceber que sou artista.
Numa entrevista passada, referiste que a melhor forma do público descrever o teu concerto seria com a frase “foi bué divertido”. Continuas a achar o mesmo?
Sim, eu acho que sim. Quero que as pessoas saiam de lá a dizer “gostei bué”, “diverti-me”, “fez-me pensar nisto” ou “aquela música emocionou-me”. No fundo, quero que as pessoas falem dos espetáculos como eu falo quando saio deles, porque mesmo quando estás a ter um dia triste e mau, sais dali com uma alegria que não se explica.
O que dizes a quem tem o sonho de um dia ser artista?
Digo que não existem sonhos estúpidos e que temos de nos conhecer bem, perceber se temos jeito para aquilo ou não, e arriscar, ser corajoso. Há coisas na vida que tu és ou não és. Não se é compositor por fazer uma canção, é algo de que precisas, e ser artista é igual, não há meios termos. É encontrar o teu sítio, seja ele qual for.