Segundo um inquérito feito por uma equipa do Centro de Psicologia da Universidade do Porto (CPUP), publicado no jornal  'Público', "quatro em cada cinco alunos de minorias sexuais e de género ainda preferem não o revelar aos professores ou funcionários no contexto da escola", por receio de serem julgados pela sua identidade.

A FORUM esteve à conversa com um dos coordenadores do “Projeto Educação” da Rede ex-aequo, Bruno Ribeiro, para saber mais sobre o trabalho realizado nas escolas, que procura educar os jovens e desmistificar conceitos, e perceber quais as maiores dificuldades que os alunos de minorias sexuais sofrem. 

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Qual o principal foco da vossa associação? 

Temos dois focos principais. Por um lado, temos núcleos LGBTI+ em todo o país, onde queremos dar um espaço seguro aos jovens para possam falar sobre as suas experiências, a sua identidade e o seu percurso. A ideia é que possam conversar de pares para pares, daí sermos uma associação juvenil. Quem lidera estes núcleos são jovens entre os 15 e os 30 anos. Por outro lado, o nosso segundo foco é o “Projeto Educação”, através do qual vamos a escolas e espaços educativos, entre outros, para tentar diminuir os preconceitos em relação a temas LGBTI+ e dar apoio aos professores que querem ajudar os seus alunos, mas nem sempre têm o conhecimento para falar destes assuntos.

Como é que selecionam as escolas onde dão formação? 

Qualquer escola pode nos convidar e nós aceitamos. Fazemos questão de explicar às instituições quem é que é a rede ex-aequo e o que o é o “Projeto Educação”, para garantir que a informação está a ser passada da maneira correta. 


 

Temos também algumas dinâmicas para fazer com que as pessoas encararem o
sistema
heteronormativo à sua volta e percebam porque é que é assim. Com o Projeto Educação,
queremos humanizar o que é ser LGBTI
+”


Consegues dizer a quantas sessões já tiveram sessões neste ano? 

Desde o início das aulas, em setembro, e até ao dia 20 de abril, tivemos 213 sessões em escolas.

Cada sessão dura quanto tempo?

Cerca de 90 minutos, porque os temas que abordamos são bastante complexos. Além disso, os jovens, geralmente, têm questões e tentamos garantir que há algum tempo para lhes responder. Damos a oportunidade aos jovens de colocar perguntas anónimas, que é importante, especialmente dado o tema, pois há jovens que se sentem ameaçados ou desconfortáveis na escola.


Os temas são adaptados consoante as escolas? 

Os temas são adaptados principalmente consoante a idade do público. Nós temos uns “temas-tipo”, mas fazemos uma adaptação em relação ao que as escolas pedem. A base é sempre desmistificar conceitos. Se formos a uma turma que já consegue entender certos conceitos, podemos falar de homofobia, transfobia, interfobia, bifobia, entre outros. Temos também algumas dinâmicas para fazer com que as pessoas encararem o sistema heteronormativo à sua volta e percebam porque é que é assim. Com o Projeto Educação, queremos humanizar o que é ser LGBTI+.

Há algum tema geral que vos costumam pedir? 

Muitas vezes pedem-nos para falar de linguagem inclusiva e levamos às escolas, por exemplo, pessoas não-binárias que têm uma grande paixão por este tema. Por vezes, pedem-nos para focar questões trans. Outras vezes, pedem-nos para focar o tema do bullying, se estiverem a existir algum tipo de micro-agressões ou até mesmo preconceitos de professores para com pessoas LGBTI+ na escola. Nesse caso, há escolas que pedem que se realize uma sessão para desmistificar, combater estereótipos e, acima de tudo, fazê-los refletir. 


 “Se houver uma pessoa que tenhamos ajudado a sentir que pode ser quem ela é, já foi suficiente


As turmas, no geral, reagem bem?

Depende muito. Já estive em turmas em que alunos e professores estavam numa posição de confronto, negando o que estávamos a explicar. Lembro-me de uma sessão em que estávamos a explicar o conceito de andrógeno e que a mistura do masculino e do feminino não é recente. Dei até como exemplo o David Bowie, que tinha uma imagem andrógena, o que não tem propriamente uma relação direta com a sexualidade. O professor sentiu-se ofendido e começou a debater connosco, afirmando que tínhamos o dever de combater esta “mania de ser tudo”. É difícil de lidar com estas situações, mas deixa-nos felizes quando os alunos nos defendem. Porque o que nós queremos é empoderar os estudantes.

As turmas costumam sair das sessões com um pensamento diferente? 

Temos alunos que não estão prontos para mudar o pensamento, mas tentamos deixar uma “sementinha”, para fazê-los pensar que as coisas podem ser diferentes daquilo que foram ensinados. Não precisamos que a turma toda saia das nossas sessões com opiniões completamente diferentes do que é ser LGBTI+. Mas se houver uma pessoa que tenhamos ajudado a sentir que pode ser quem ela é, já foi suficiente. Muitas pessoas LGBTI+ não tiveram este apoio enquanto cresceram, e é isso que queremos dar.


 

“[…] é isso que me cativa – tentar que a próxima sociedade seja menos ofensiva, tenha menos ódio


E é esse apoio que o “Projeto Educação” pretende ser? 

O “Projeto Educação” tenta mostrar que há uma lacuna de exemplos, de pessoas a quem se possa pedir apoio no percurso identitário, de evolução, de crescimento. Porque o tema da sexualidade, em muitos casos, acaba por ser um tabu. O “Projeto Educação” também é um projeto em que estamos a tratar da igualdade de género em pessoas que ainda não estão a lidar com esse problema. Esta prevenção serve para educar as camadas mais jovens de forma a que, quando crescerem, existam menos probabilidades de alguns obstáculos surgirem. E é isso que me cativa – tentar que a próxima sociedade seja menos ofensiva, tenha menos ódio.

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