“Só levamos flores contra canhões”
, escreveu Rui Cardoso Martins, 20 anos depois. Num artigo publicado no jornal Público – intitulado “Parece mentira” – o jornalista relata a história da viagem até à costa de Timor e conta um desabafo que ouviu no convés: “é preciso o mundo estar muito louco para ser preciso fazer uma coisa destas”.

E que coisa faziam, afinal, 120 estudantes de 23 países num velho barco junto à costa de Timor? A iniciativa partira, uns meses antes, da então recém-fundada revista Forum Estudante. Depois do massacre no Cemitério de Santa Cruz, em que as forças militares indonésias mataram 400 pessoas, a Forum Estudante organizou uma viagem de barco até Timor, com o objetivo de homenagear as vítimas e chamar à atenção da comunidade internacional para a situação vivida pelos timorenses.

 

Reportagem de José Rodrigues dos Santos para a RTP, a bordo do Lusitania Expresso

 

Anos mais tarde, o então Diretor da Forum Estudante, hoje seu CEO, Rui Marques, contou à RTP os objetivos da iniciativa: “reunir jovens estudantes de todo mundo, numa atuação pacífica, para que fossem colocar uma coroa de flores no cemitério de Santa Cruz”. Acima de tudo, porém, o objetivo era “que Timor Leste nunca mais fosse esquecido até ao dia em que pudesse conhecer a liberdade”.

 

Flores e canhões

Prestes chegar à costa timorense, milhares de quilómetros depois, as forças militares indonésias intercetaram o Lusitânia Expresso, a 16 milhas de Díli. No dia 11 de março de 1992, três fragatas de guerra bloquearam o acesso à costa e deram uma ordem: “abandonem imediatamente esta área e prossigam para o mar alto. Over”. Perante a resistência do Lusitânia, os canhões foram mesmo levantados para a posição de ataque.

As flores seriam atiradas ao mar. “Para o mar que as levará até ao mar de Timor”, disse então Rui Marques aos restantes tripulantes. “Não chegámos a Timor mas cumprimos a nossa missão”, continuou o Diretor da Forum Estudante: “colocar Timor na Agenda Internacional”. “Hoje é o primeiro dia da nova missão”, concluiu.

 


No dia 11 de março de 1992, três fragatas de guerra bloquearam o acesso à costa e deram uma ordem: “abandonem imediatamente esta área e prossigam para o mar alto. Over”. Perante a resistência do Lusitânia, os canhões foram mesmo levantados para a posição de ataque.

 

A liberdade do povo timorense chegou oficialmente dez anos depois, a 20 de maio de 2002. Mas a missão daquele grupo de estudantes e jornalistas nunca mais seria esquecida. Sobretudo, por quem esperava, em Timor, pelo apoio que chegava de Portugal. Um impacto que fica claro nas palavras de um sobrevivente do massacre citado por Rui Cardoso Martins: “quando soubemos que vinha aí o navio Lusitânia Expresso, percebemos que não estávamos sozinhos. Deu-nos força. E estávamos prontos a morrer outra vez. Obrigado pelo que fizeram por nós”.