No início do ano letivo 2024/2025, o Governo recomendou a proibição da entrada e do uso de telemóveis na escola para os alunos dos 1.º e 2.º ciclos do Ensino Básico. O 3.º ciclo também se encontra incluído nas medidas, com as restrições do uso do telemóvel a serem simplesmente aplicadas durante a hora do recreio.

O uso de smartphones por parte dos alunos do ensino secundário também foi alvo de avaliação do Governo. Citado pela CNN Portugal, o ministro da Educação, Fernando Alexandre, sublinhou a importância de criar “uma estratégia dentro das escolas para que os smartphones sejam usados de uma forma responsável”, de forma a beneficiar “o ambiente escolar e o desenvolvimento dos nossos jovens”.

A decisão tomada teve por base resultados de estudos internacionais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA). Estas investigações mostram que 34% dos alunos em Portugal diz distrair-se com dispositivos digitais (acima dos 30% de média da OCDE). Adicionalmente, 25% diz distrair-se com outros colegas que usam dispositivos como telemóveis (em linha com a média da OCDE). 

No relatório PISA 2022, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) refere também que, nos países onde o uso do telemóvel é proibido nas escolas, os alunos foram “menos propensos a relatar distrações”

 

 

As reações à decisão

Em declarações à Sapo, a presidente da Confederação Nacional de Associações de Pais (CONFAP), Mariana Carvalho, referiu haver consenso quanto à necessidade de regras quanto ao uso de telemóvel em ambiente escolar, mas defende que a proibição não é solução. "A sensibilização e formação são sempre a melhor opção, isto com a ajuda dos encarregados de educação", afirmou Mariana Carvalho. 

Já a representante do movimento Menos Ecrãs Mais Vida, Mónica Pereira, em declarações à Lusa, lamentou a opção do Ministério da Educação em manter a decisão sobre a regulamentação do uso de telemóveis nas escolas nas mãos dos estabelecimentos de ensino em vez de ser este a elaborar as regras.  “Ficamos com a clara ideia de que o Ministério não vai seguir essa linha, o que é uma pena”, disse após reunião com o secretário de Estado Adjunto e da Educação, Alexandre Homem Cristo. 

 


«A sensibilização e formação são sempre a melhor opção, isto com a ajuda dos encarregados de educação»

Mariana Carvalho, presidente da CONFAP em declarações à Sapo


 

A autonomia das escolas, contudo, é elogiada pelo presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima: “Surge em jeito de recomendação, o que me agrada. Não fere a autonomia das escolas que tomarão uma decisão, como muitas já tomaram”, disse o dirigente, em declarações à CNN Portugal. Filinto Lima classificou ainda a ação como pertinente e salientou que esta “pode dar força a outras escolas de proibirem o uso do aparelho”.

Escolas já aderiram em Portugal

Segundo o Jornal de Notícias, 2% dos agrupamentos portugueses decidiram proibir o uso de telemóveis. Um dos exemplos é a Escola Básica da Lourosa, localizada em Santa Maria da Feira e que, em 2017, proibiu os dispositivos móveis em todo o recinto escolar numa medida que foi “um sucesso” para a diretora do Agrupamento de Escolas António Alves Amorim e que potencializou a socialização entre os alunos.

No passado ano letivo, as escolas de Almeirim também seguiram o exemplo, proibindo o acesso aos telemóveis aos alunos entre os 1º e 3º ciclos do ensino básico, com os alunos do Secundário a só poder utilizar os telemóveis na hora de almoço. Em Barcelos, na Escola Básica Integrada de Fragoso, mais de 500 alunos do 1º ao 9º ano estão proibidos de usar os telemóveis nas instalações do estabelecimento de ensino.

 

 

Em Gondomar, no Agrupamento de Escolas Infanta D. Mafalda, encontramos outro exemplo. No mês de março foi anunciada uma proibição parcial do uso dos telemóveis, com as escolas a estabelecerem dias específicos “sem telemóvel” para criar “outras rotinas de comunicação, de convívio e de crescimento em grupo”

Recentemente, o Jornal de Notícias noticiou a que o Agrupamento de Escolas Soares dos Reis, em Vila Nova de Gaia, tomou a decisão de até ao final do ano, proibir o uso de telemóveis nas salas de aula e no recreio. A medida foi feita a pensar “na saúde dos alunos”, de forma a promover a socialização e a combater o bullying. 

  


Benefícios e riscos da utilização de smartphones 

 O documento Orientações para a Utilização de Ecrãs e Tecnologias Digitais nas Escolas aponta algumas mais-valias na utilização de smartphones em contextos lúdicos e escolares, como benefícios cognitivos, psicológicos e sociais com uso moderado (1 a 2 horas). Por outro lado, acrescenta o documento, utilizados de forma consistente e com propósito definido, os smartphones podem estimular o envolvimento nas aulas e facilitar a aprendizagem autónoma e colaborativa dos alunos. Por outro lado, numa entrevista à Deco Proteste, em 2023, o professor catedrático da Faculdade de Motricidade Humana (FMH) da Universidade de Lisboa, Carlos Neto, lembrou que o uso destes dispositivos contribui para o aumento do sedentarismo e da obesidade infantil. Também em 2023, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), aconselhou os países a fazerem uma revisão sobre a utilização de smartphones em contexto escolar indicando o impacto negativo no desempenho académico e no bem-estar físico e mental, bem como o risco acrescido de cyberbullying e ameaças à privacidade.


A opinião dos estudantes

A FORUM desafiou alguns estudantes para saber a sua opinião sobre o uso do telemóvel nas escolas. “Com os avanços da tecnologia até aos dias de hoje é inegável pensarmos numa escola sem ela”, diz Nuno Fians, estudante do 12.º ano na Escola Secundária do Fundão. Para Nuno, o ensino deve ser mais tecnológico e assim efetuar a transição ecológica “de que as escolas tanto precisam”

Na perspetiva do estudante, o telemóvel pode fazer parte da solução ao invés de ser um problema, contribuindo para uma escola onde se terminem com os testes em papel, simplesmente partilhando o documento em vez de “estar a imprimir toneladas de papel que chegam às escolas todos os anos”.

Esta é uma opinião que não é partilhada por Henrique Magalhães, que estuda na Escola Profissional Profitecla do Porto. “Concordo plenamente com a recomendação do Ministério da Educação de restringir o uso destes dispositivos nas aulas”, começa por partilhar. Henrique acredita que o uso do telemóvel dificulta a socialização entre colegas e que esta última é “essencial para o nosso desenvolvimento pessoal e social”. O estudante vai mais longe: “Na minha opinião, deveria ser uma regra obrigatória em todas as escolas”.

 

 

Embora o jovem de 16 anos reconheça a utilidade dos telemóveis quando utilizados de forma responsável, vê o equilíbrio do uso da tecnologia e das interações cara-a-cara como algo que pode ajudar a criar um ambiente escolar mais saudável e produtivo.

A ideia de equilíbrio é também destacada por Thäddaus Möller, estudante na Escola Secundária de Alcains, que acredita ser preciso “encontrar um equilíbrio que permita aos alunos desfrutar das vantagens da tecnologia”, sem que isto comprometa a “sua aprendizagem e desenvolvimento social”

Enquanto defende a limitação do uso de telemóveis no primeiro e segundo ciclo do ensino básico, o estudante pensa que do terceiro ciclo para a frente tal limitação “deve ser revista”. Isto porque, acrescenta, nessa fase há uma mudança das “dinâmicas educativas” e “os alunos já demonstram uma maior maturidade e responsabilidade na utilização da tecnologia”. “Promover um uso consciente e equilibrado dos dispositivos móveis pode ser mais benéfico do que a restrição”, conclui.