Entrevista a Ana Cardoso, Directora do Grupo EGOR

Forum Emprego - Num mundo em permanente mudança, os critérios de avaliação dos candidatos vão-se alterando, ou continuam a ser os mesmos?
Ana Cardoso -
Num mundo em constante mudança, chegam novas exigências de produtividade, competitividade e mobilidade, que lançam desafios às organizações.
É hoje assumido que a capacidade de sobrevivência das empresas depende fortemente das competências e características dos seus colaboradores. Se, num passado não muito distante, as empresas optavam pela valorização técnica e profissional, avaliando quase exclusivamente capacidades práticas de execução laboral, actualmente são enaltecidas de forma crescente aptidões transversais e do foro comportamental, como por exemplo competências de comunicação/negociação, relacionamento interpessoal, iniciativa, inovação, criatividade, etc.
Consequentemente, e no pressuposto de que as organizações mais competitivas são as que conseguem tirar melhor partido da potencialidade dos indivíduos que as integram, assiste-se ao deslocar do paradigma das qualificações, mais ligado à tarefa e ao trabalho, para o paradigma das competências, mais ancorado no indivíduo.

FE -  O que é mais importante na avaliação de um candidato: a formação académica, a experiência profissional ou as competências profissionais?
AC -
Todos os factores são importantes e têm que ser avaliados conjuntamente, dependendo naturalmente do perfil requerido. Ou seja, para se realizar uma avaliação objectiva do perfil do candidato é necessário averiguar a sua formação, experiência e vivências profissionais, para além de outros requisitos específicos à função que se afigurem relevantes.
Mas para além dos necessários conhecimentos técnicos e/ou experiência profissional, o actual profissional necessita também de reunir um conjunto de competências genéricas de carácter pessoal e interpessoal. Deve ainda dominar toda uma panóplia de competências instrumentais.
O próprio conceito de competência evoluiu: falar de competências hoje é falar sobretudo de comportamentos ou acções (e não apenas de qualificações, ou mesmo de características pessoais).
Desta forma, as organizações assumem cada vez mais, que o segredo de uma empresa bem sucedida reside no integrar de valores e talentos humanos capazes de pensar, interpretar, raciocinar e agir em prol do sucesso colectivo da organização.

Assim, no quadro actual das organizações, possuir conhecimentos em domínios técnicos altamente especializados, saber gerir a informação ou usar a tecnologia, revela-se por si só insuficiente para garantir um comportamento de sucesso em termos de actuação profissional. Importa também dominar um conjunto de outras competências de natureza comportamental que, sem serem suficientes, são seguramente necessárias.

FE -  Relativamente à personalidade dos candidatos, qual o requisito fundamental para integração no mercado de trabalho?
AC - A adaptação rápida às mudanças – única constante do mundo actual – exige a flexibilização do emprego, da organização e das pessoas.
Aquilo a que se vai assistir, é ao acelerar da mudança nas formas de trabalhar em consequência do desenvolvimento tecnológico. E cada vez mais esta evolução tecnológica afecta a natureza do trabalho e requer uma evolução das competências dos profissionais, de modo a que estes se possam adaptar à evolução da sua profissão e postos de trabalho. Esta capacidade de adaptação é designada flexibilidade funcional.
Como tal, flexibilidade é hoje um requisito essencial à integração no mercado de trabalho.

FE -  Quais os defeitos que considera mais graves?
AC - Se considerarmos a flexibilidade um dos requisitos fundamentais à integração do mercado de trabalho, esta requer um investimento a longo prazo por parte dos profissionais em termos de disponibilidade para aprender e em termos de motivação para vir a assumir funções diferentes ao longo do seu ciclo de vida. Assim, a falta de capacidade e de atitude a uma aprendizagem permanente e à mudança ao longo da vida profissional, serão seguramente condicionadores à carreira profissional.

FE -  Existe um perfil de candidato ideal?
AC - Existe. Mas que é diferente do perfil do candidato real. Se não vejamos, poderíamos considerar como candidato “ideal” aquele que corresponderia a 100% aos seguintes critérios: bom nos números, bom a escrever relatórios, bom na escrita criativa, bom a falar com outras pessoas, bom a persuadir os outros, bom a tomar decisões, bom a resolver problemas, bom a organizar o seu tempo e a definir prioridades de trabalho, capaz de delegar tarefas nos outros, bom a ensinar competências, capaz de trabalhar sob pressão, bom a motivar outros, capaz de aprender tarefas ou assimilar informação rapidamente, etc., etc.
Provavelmente, o candidato “real” corresponderá a 50% - o que já é muito bom.
De facto, o importante é perceber quais os principais requisitos e competências para o bom desempenho de determinada função, ou seja, quais os factores críticos a ter em conta e não uma lista exaustiva, e por isso mesmo irrealista, de competências. E esse será seguramente o perfil do candidato que se pretende.

FE -  O que causa melhor impressão num entrevistado?
AC - Se o entrevistado souber bem o que tem para oferecer e conseguir demonstrá-lo de maneira eficaz, estará no bom caminho para fazer uma boa entrevista.

FE -  Quais as áreas com maior empregabilidade, ou seja, quais as áreas consideradas mais promissoras em termos de emprego, no futuro?
AC - A constante mutação que caracteriza o mercado de trabalho leva-nos a prever que ocorram tendências oscilantes nas áreas que vão registando maior procura. No entanto, uma coisa é certa: no futuro, o mercado de trabalho será mais qualificado e flexível.
Do mesmo modo que a exigência vai ser maior depois da crise: as empresas vão querer não só menos gente, como gente mais qualificada.
De qualquer forma, actualmente e nos tempos mais próximos, cursos como medicina ou em áreas de saúde em geral, assim como em áreas tecnológicas (informática, engenharia, etc.) ou hotelaria e restauração, são cursos bastante requisitados pelas empresas e como tal, com mais hipóteses de saídas profissionais.
 
FE -  E quais os empregos do futuro?
AC - Actualmente o sector das energias renováveis e alternativas está optimista, tendo um estudo recente revelado a tendência para a maioria das empresas actuantes neste sector, preverem um aumento significativo ao nível do seu capital humano.
Mas a existirem certezas acerca do mundo de trabalho de amanhã, provavelmente elas serão uma maior exigência no que respeita à qualificação da força de trabalho e uma organização laboral onde a flexibilidade será a palavra de ordem.

Também provavelmente um mundo mais especialista e global onde, para se vencer, é fundamental um elevado nível de educação, de formação e de especialização. Daí que, no futuro, será cada vez mais acentuada a diferença entre as pessoas qualificadas e as não qualificadas em termos de oportunidades.

FE -  Que conselho daria a um jovem que inicia a jornada de procurar o 1º emprego?
AC - Se um jovem procura o seu 1º emprego, então tem de encarar este objectivo com muita determinação. Tal implica dedicar-lhe tempo e dedicação. Procurar emprego é um trabalho a tempo inteiro e pressupõe sempre trabalho pessoal e um plano de acção.
  Assim, o 1º passo para ser bem sucedido é saber exactamente o que se quer e canalizar esforços e energias nesse sentido. Não faz sentido “disparar em todas as direcções”, partindo do pressuposto que desta forma terá mais possibilidades de acertar no alvo. Ou seja, a resposta “em série” (como por ex., responder a todos os anúncios indiscriminadamente ou enviar em catadupa) ou uma “edição” em massa do curriculum é uma perda de tempo. Pelo contrário, a resposta a um anúncio deve ser coerente: a carta de candidatura deve explicitar as razões do interesse na função e o currículo deve comprovar um conjunto de conhecimentos e experiências consonantes com o cargo a que se concorre.

Um 2º passo será pesquisar e preparar-se bem para a entrevista – por exemplo, pesquisar informação fundamental sobre a empresa a que se candidata (historial, produtos, características, objectivos, concorrentes no mercado, etc.). Na entrevista, dar as respostas e fazer as perguntas mais adequadas no encontro para obter emprego, é igualmente fundamental para ter sucesso.

E, se alguma dose de ilusão misturada com optimismo e entusiasmo, são uma excelente receita para enfrentar o mercado de trabalho, convém também não perder a noção da realidade e manter os pés bem assentes no chão. Por exemplo, jogar na antecipação pode ser um bom começo: aproximar-se do mercado de trabalho antes de terminar os estudos, permite ganhar tempo e preparar melhor essa entrada. Do mesmo modo que experiências práticas e/ou estágios em simultâneo com os estudos são, sem dúvida, mais-valias para a valorização curricular de cada um.

Perceber igualmente, que um salário de início de carreira nem sempre corresponde às melhores expectativas mas que tal não é motivo para desperdiçar oportunidades. Nem sempre tudo é o que parece e, por vezes, um cenário pouco atractivo pode, passada a fase de integração, surpreender pela positiva.


FE -  Qual o erro mais frequente num processo de recrutamento por parte do entrevistador? E por parte do entrevistado?
AC - As pesquisas mostram que as entrevistas são um instrumento importante, mas algo falível – o desempenho passado, provas de situação ou testes são provavelmente menos falíveis - para avaliar o futuro desempenho. De qualquer forma continuam a ser cruciais em qualquer processo de selecção para um emprego. Daí que o entrevistado não as deve encarar de ânimo leve mas, ao contrário, dedicar o tempo necessário ao seu planeamento e preparação.
Estudos também indicam que o resultado da entrevista muitas vezes é decidido nos primeiros 2 ou 3 minutos, quando é realizada por um entrevistador sem preparação específica e que estas decisões são tomadas a nível intuitivo e dependem da relação que se estabelece entre o entrevistador e o candidato. Tal significa que o entrevistador pouco experiente ou preparado, pode incorrer facilmente em avaliações precipitadas e incorrectas.

FE -  A diversidade e quantidade de cursos existente e o nível de preparação dos licenciados, satisfazem as necessidades do mercado?
AC -
A diversidade e quantidade de cursos existentes é suficiente em termos genéricos, muito embora haja desequilíbrios face às reais necessidades do mercado.
Para satisfazer as necessidades do mercado, e por conseguinte das empresas, os estabelecimentos de ensino devem fomentar e rever as articulações com o meio empresarial, nomeadamente através de projectos específicos, estágios ou divulgação dos cursos junto das entidades empregadoras.

Numa economia cada vez mais global, é essencial para os futuros profissionais, uma maior exposição a línguas e culturas, ou seja, um envolvimento além-fronteiras. Daí que o incentivo a intercâmbios internacionais devam ser prioritários ainda no decorrer da vida académica. Do mesmo modo, as profissões de hoje e de um futuro muito próximo, vão exigir competências em TIC (tecnologias de informação e comunicação) em todos os sectores, fazendo com que as competências tecnológicas assumam uma prioridade crucial no ensino e na formação.